sexta-feira, 11 de setembro de 2015

Vasco Pulido Valente


O romantismo voltou - VPV - in PUBLICO
11/09/2015
Um debate
12/09/2015
A doença de Portugal
13/09/2015

"Vinte e cinco anos depois da queda do Muro, o romantismo político voltou. Para ficar

A gente vária e geralmente analfabeta que manda na televisão e nos jornais decidiu que o debate entre o dr. António Costa e Passos Coelho seria decisivo para a campanha e, naturalmente, para a eleição. Claro que não foi. Foi um espectáculo no Museu da Electricidade, caótico e repetitivo, que não “esclareceu” ninguém.

Cada um dos candidatos representou a personagem que lhe estava destinada – António Costa a de chefe popular com um programa debaixo do braço e de quando em quando uma ocasional berraria; e Passos Coelho a de estadista paciente e sereno que mete na ordem um secretário de Estado incómodo. Os portugueses parece que gostaram mais de Costa do que de Coelho, porque detestam a autoridade e gostam de lhe assobiar às canelas do outro lado da rua.

Do essencial não se falou. António Costa não se permitiu explicar com que dinheiro vai emendar as desgraças do seu pobre país – ponto que também não interessou aos jornalistas que alegadamente “dirigiam” o debate. E Passos Coelho também não se deu à excessiva franqueza de nos confessar o que se propunha fazer do país nos próximos quatro anos. Nada disto espanta. Os portugueses só têm uma pergunta na cabeça: vamos ficar pior com o dr. Costa ou com Passos Coelho? Pelas cenas do Museu da Electricidade, ficou a impressão de que o público que gosta de engenharia social (e Costa levou rolos de papel com os planos todos) simpatizou mais com a aventura tradicional da esquerda: a de partir alegremente com um mapa errado para sítio incerto. Em compensação, a horrenda espécie de criaturas que não se mete em sarilhos sem contar o dinheiro muito provavelmente preferiu Passos.

Acabado este intermédio, que pouco se distinguiu do concerto de uma banda qualquer, a zaragata irá continuar. Os candidatos e a sua tropa pregarão a sua mezinha, insultarão o próximo e, jurando que não prometem, continuarão como de costume a prometer, perante a indiferença do cidadão comum. O grosso do eleitorado ficará em casa, olhando com indiferença o desvario do pequeno bando que nos quer governar. Nós, por acaso, sabemos que o protectorado de Bruxelas não acabou e que uma crise nos mercados financeiros pode arruinar num minuto os mais perfeitos sonhos de homens e de ratos. Vinte e cinco anos depois da queda do Muro, o romantismo político voltou. Para ficar.
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Um debate
"O público e os comentadores gostam de excitação e de alarido, como os pacóvios gostam de ver desastres."



"Não se percebe por que razão o jornalismo português (profissional ou amador) resolveu achar que António Costa tinha ganho a Passos Coelho.

A ideia parece ser que um debate é uma espécie de altercação de taberna em que ganha quem der mais murros no adversário e se mostrar, de maneira geral, mais malcriado e belicoso. Se este modelo se aplica a uma discussão sobre o Estado e a vida dos portugueses nos próximos cinco anos, temos, de facto, razão para desesperar. António Costa gritou e esbracejou mais do que Passos Coelho. E Passos Coelho foi falando com uma certa serenidade e não permitiu que, da parte dele, a conversa degenerasse num chinfrim com o primeiro-ministro. Mas, dizem os peritos, perdeu. O público e os comentadores gostam de excitação e de alarido, como os pacóvios gostam de ver desastres.

Veio a seguir um coro geral de lamentações. Afinal, o debate não tinha esclarecido ninguém. Primeiro, porque se discutiu durante muito tempo a personagem de Sócrates (um argumento absurdo). Segundo, porque os portugueses não perceberam metade do que ouviram (a reforma da segurança social, a saúde, a troika, a dívida pública e por aí fora). Só que, se não perceberam, o único critério que lhes ficou foi a intensidade do barulho dos dois cavalheiros em presença. E isto para não entrar no capítulo das mentiras, que ferveram do princípio ao fim: sobre a bancarrota, sobre o pedido de resgate, sobre o “memorando”, sobre o melancólico facto de que, à mais pequena crise nos mercados financeiros, não haverá dinheiro para as salvíficas promessas de Costa ou para os sonhos sem sentido de Passos.

Não passou pela cabeça dos jornalistas que “presidiam” ao debate com a sua insuportável embófia perguntar às duas notabilidades que ali putativamente discursavam ao país onde tencionavam arranjar o dinheiro para a redenção da Pátria. Ao contrário do que um observador ingénuo talvez concluísse, em todo aquele espectáculo, digno de Las Vegas (e tirando uns 600 milhões que faltam à segurança social), não se ouviu a imunda palavra “dinheiro” uma única vez. Vivemos numa situação periclitante em que o menor abano pode deitar tudo abaixo. Mas naquela arena (não sei que outra coisa lhe devo chamar) não se mencionou a Europa, a América ou a China. Apesar da retórica sobre a “globalização”, Portugal acaba em Badajoz. E o dr. Costa e Passos Coelho, coitados, suspeito que também.
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