domingo, 15 de setembro de 2013

Rocha da Relva - S. Miguel Island - Azores - Portugal



Fajã da Relva, mais conhecida como a “Rocha da Relva”.
S. Miguel - Azores Islands - 9/2013


De origem semelhante à maioria das “Fajãs” do arquipélago dos Açores, teve, provavelmente e antes do inicio do povoamento das ilhas, origem em algum corrimento de terras de grande escala, formando plataforma junto do mar, acessível e utilizável para fins humanos.

No perímetro da Ilha de S. Miguel este “nicho” junta-se, em morfologia e uso, à Fajã do Calhau, à Fajã do Araújo e Lombo Gordo e, ainda, à Ribeira Quente.

Ao longo de séculos eram lugares de “recreio”, entendendo-se como tal aqueles onde se podia passar algum tempo extraindo prazer daquilo que lá se fazia: cultivando e tratando de vinha e confraternizando com vizinhos consumindo o vinho produzido.
Na maioria das Fajãs esta tradição perdeu-se nas últimas décadas, tendo a cultura da vinha sido substituída pelos prazeres balneares e da experimentação arquitectónica. Aqui, na Rocha da Relva, e por falta de areal ou praia, preserva-se ainda o prazer pela cultura da vinha e pela socialização associada. Aqui, um fim de semana entre latadas de vinha, muros de pedra, fogueiras de churrascos, som dos cagarros, noites estreladas e o som do rolar das pedras batid
as pelas ondas, simula-se um regresso ao passado local cujos ecos a vertigem da vida actual tenta apagar.



 






Sinais de algum "colonialismo" ... cultural.





Pode-se chamar a isto uma zona balnear? Por aqui "marinheiros de água doce" não tem muitas facilidades ...



Por aqui ninguém se incomoda muito com a precisão do nível e do prumo. Os padrões da precisão geométrica na arquitectura não tiram o sono a ninguém.



Areia, por aqui, existe, mas a dimensão dos grãos é tal que não passa em qualquer peneiro.


O acesso a esta Fajã é bom mas impossível para automóveis. Para ajuda no transporte daquilo que de mais pesado seja necessário, existem apenas estes animais de "tracção integral". Consta que alguns são comunitários e residentes e, assim, quem precisa, usa e contribui com bom trato. Enfim, num local como este, todos se conhecem e, em geral, desfrutam do prazer de partilhar aquilo que tem e pode ser útil ao vizinho, incluindo o burro.




Para alguns, contribuir para o equilíbrio ecológico dos insectos é algo que requere paciência de cavalo ... ou de burro.





E se existem aqueles que vão à Rocha ... também existem aqueles que apenas passam pela "Rocha" ...


Por aqui cada um dá à estética a expressão que entende. Alguns conseguem um refinamento equivalente ao de outras paragens bem mais sofisticadas do que esta.



Acredito que a produção de vinho neste local não seja grande. Acredito até que o custo final deste vinho seja mais elevado que a maioria dos importados. Todavia o prazer do consumi-lo é apenas mais um, a que se juntam todos os outros associados à criação e preparação desses momentos.

E, no fim de cada dia, antes de se começarem a ouvir os primeiros cagarros, o sol faz a sua despedida e mergulha para lá do Atlantico, ao mesmo tempo que emerge algures no Pacifico.





 2014

Em 2014 voltamos a passar por aqui. Da primeira vez encontramos pelo caminho apenas um proprietário emigrante e reformado - e mais alguns poucos sinais de presença silenciosa.


Da segunda vez (em 2014) viemos como convidados para vindima. Nesta altura o "transito", e a vida, já eram outros!

Nem todos os fins-de-semana de Setembro são assim tão luminosos e calmos.






Este ano os Espanhóis andavam por aqui ... se calhar a sondar os restos de algum Galeão afundado na época Filipina.


Não é apenas na ilha de Santa Maria (ou em Machu Picchu) que se encontram destes socalcos murados. No passado a vida por aqui deve ter sido tão dura como por lá.

Quase como que um "Encontro Imediato", mas não do "terceiro grau"!

Na altura das vindimas há sempre mais transito do que no resto do ano. Mas nesta data estava o atalho quase "congestionado".
 

Desde pequeno  se manobra com o que é necessário. E quem disse que é necessário chegar aos 21 anos de idade para poder conduzir um equídeo... ou outra coisa qualquer?




Aqui se nota que o mar só deixa de "comer" terra quando encontra basalto (ou traquito) para lhe fazer frente. Por isso não é difícil de imaginar o antes e o depois destas fajãs ao longo dos séculos.



Basaltos, traquitos e material pomítico policromático misturam-se por aqui, dando uma imagem típica da costa sul da ilha, contrastando entre si e com o verde arbustivo, canavial ou de mata baixa de faias e outras.
 
Hora de descanso, mas não para as moscas.


Para uns o regresso duma viagem turística de observação de cetáceos (principalmente de golfinhos). Para outros uma saída para um por-do-sol no mar.






Para os tempos mortos, nada como levar alguns apetrechos de pesca, e alguma "minhoca".





Ao por-do-sol o colorido da paisagem transforma-se - e as sombras e contrastes cromáticos amplificam-se.

 





Este arvoredo parece ter presenciado muitos equinócios; talvez centenas deles.


A surpresa da noite: "Cracas" (em Inglês -Thoracica / Em latim - Semibalanus balanoides ou Chthamalus stellatus).
E se as "lapas" não são abundantes na costa, cracas destas ainda o são menos e mais dificeis de "capturar".









Por aqui, luz só a de lanterna a petróleo - ou com gerador eléctrico. Confesso que para uma única noite prefiro sentir as origens ... ou quase.


          Novembro de 2014

E como não há duas sem três (em 2014), lá fomos, novamente, ver se o vinho já estava "cozendo" conforme é habitual. E, já agora, pernoitava-se por lá e aproveitava-se para por as "mentiras" em dia.
 
 
Por estranho que paraeça esta foi a vez que aqui fomos, neste ano, em que encontramos mais gente por aqui. Talvez não tenhamos apanhado o pico das vindimas mas, seguramente, viemos em dia em que algum vinho já estava a ser "vigiado".

A noite não estava com céu limpo, nem animada pelo som dos cagarros, mas a sensação de se estar num "mundo à parte" estava presente como sempre.


Como é natural e espectável. as noites por aqui não são povoadas pelas amenidades urbanas nem pelas distracções televisivas, da net ou dos telemóveis. Por isso há espaço para as alternativas ...  e uma delas é a gastronomia. A sorte de ter à beira um "Master-Chef" da culinária ajudou, e muito. O arroz de Cabidela estava original e "fabuloso" sem esquecer o pão caseiro do anfitrião e a aguardente de Santa Maria.


 
 

Manhã radiosa e tempo para arrumar a bagagem. A estas horas, como o contraluz e sombras da manhã, a geologia e orografia da zona ganham outras formas ... ou outras perspectivas.

 
 
 

Entre cabeça e boca de Leão ou furnas/grutas de ancestrais trogloditas, há sempre motivo de espanto quando se olha para esta paisagem costeira insular.
 

Antes da saída do atalho, uma passagem de olhos pela "Rocha do Cascalho", independente da outra: a da Relva.
 

E um ultimo olhar para trás ... 
... sempre com mais uma casa a aparecer entre o canavial ... 

E a partir do estacionamento Municipal, é interessante uma caminhada pelo caminho velho até à Igreja da Relva. É mais notória, assim, a transição de "mundos" - assim como é quase chocante a mistura/mistela urbanistica que os poderes municipais tem permitido neste aglomerado rural da relva. A incoerência arquitectónica parece ter sido proporcional ao numero de "planos urbanísticos e de ordenamento" feitos abrangendo as zonas rurais desta ilha.

 

ROCHA DA RELVA - EM FINAIS DE 2017

 


 


 Pedras Brancas ... ou Traquitos ... segundo os dr.s da arte.
 
Alguns cagarros mantém-se pela ilha ainda após Setembro.





Água mole em pedra dura, tanto bate até que fura.


 Figos de "babosa", em época tardia.

Até meados do séc. XIX, quase todas as fontes da Ilha de S. Miguel (Açores), do arquipélago ou do país eram semelhantes a esta em baixo.




 
 
 
 
 
 
 




 
 


 


 

Rocha de Relva - Setembro de 2018
Cumpriu-se o ritual da vindima
entre um jantar e um almoço































e o passar a revista à via pedonal, percorrida durante uma dezena de gerações por quantos desbravaram, construiram e mantiveram aquele local.



Localizações e Mapas:




3 comentários:

rocha da relva disse...

Achei muita piada ao seu comentário/titulo nas fotografias da minha casa da Rocha da Relva.

(...)Por aqui ningem se incomoda muito com a precisão do nível e do prumo. Os padros da precisão geométrica na arquitectura não tiram o sono a ninguem. (...)

Gostaria de acrescentar que "Deus escreve direito por linhas tortas".

Jorge da Motta Vaz Botelho Rego Borges disse...

Agradeço o comentário!:)
De facto achei graça à casa e destaca-se, pela positiva. E achei que o proprietário não se sentia vinculado aos padrões técnicos vigentes, o que é raro nos dias que correm, onde tudo é padronizado, regulamentado, “standarizado”, uniformizado e profissionalizado. Parece ser esta “Fajã” ainda um espaço de liberdade, onde se não é obrigado a fazer aquilo que está nos “livros” dos outros.
O que conta, na minha opinião, é o prazer de se fazer o que se gosta e o de ver o resultado dessa acção. E parece que foi isso que fizeram. Se os guardiões da "uniformização" não gostarem, paciência ... que olhem para outro lado.
Pelo que vejo agora nem eu me preocupei muito com a precisão da escrita ... mas isso é fácil de corrigir, de imediato ;)

Anónimo disse...

Caro amigo. Adorei as fotos e os seus comentários a esta fajã. Um local que considero fascinante que desafia muitas imposições do mundo moderno. É sem duvida um mundo à parte repleto de cultura, beleza natural, mas isto o seu "artigo" faz jus. Encanta-me saber que ainda existem pessoas resilientes em manter esse lindo "cantinho". Abraço para si e todos os que mantêm esse local imaculado.